sexta-feira, 14 de agosto de 2009

1º Encontro da Pós-Graduação do IQ/USP – 75 anos USP

Artigo Científico e Divulgação Científica


O Núcleo José Reis de Divulgação Científica da ECA/USP agradece o convite e sente-se honrado em participar deste “1º Encontro da Pós-Graduação do IQ/USP – 75 anos USP” e se alia ao objetivo do encontro exposto no site do evento que é o “intuito de divulgar as pesquisas realizadas no IQ e facilitar a troca de conhecimento”.



Agradeço à Comissão organizadora especialmente os professores doutores Josef Wilhelm Baader e Maurício da Silva Baptista e ao grupo de alunos elegendo a Graciele, que foi o nosso contato, para homenagear a todos que certamente fizeram um grande esforço para este evento acontecer.
Ainda pela Internet vi que o segundo tema deste encontro é Educação e Divulgação Científica, um tema muito querido para nós do NJR-ECA/USP e há muito de José Reis e Crodowaldo Pavan, personagens da História da Ciência que sempre estiveram ligados ao nosso núcleo. Esses dois cientistas e comunicadores da ciência por excelência nunca me esqueço de render a nossas respeitosas homenagens. Sempre tiveram grande preocupação para que o conhecimento científico fosse amplamente divulgado à sociedade.



Fomos convidados para falar de Redação de Artigo Científico.



Antes de tudo, no nosso ponto vista, isto é para o grupo de pesquisa do núcleo, Artigo Científico e Divulgação Científica caminham lado a lado até pela natureza que cada um trás em si. Para um divulgador científico tendo em vista a comunicação do conhecimento científico para o grande público, o Artigo Científico é a linguagem do outro mundo. Trata-se de um texto que tem um código fechado que só os iniciados vão entender. O pobre mortal comum que tenta acompanhar o desenvolvimento da ciência através de leitura de Artigo Científico ou é um gênio onipotente que a tudo domina, um Deus neste caso, ou um leigo como todos nós em relação ao conhecimento do vizinho. Essa é a definição do leigo e do detentor do conhecimento. Entender essa relação e ter consciência desse nó comunicacional é crucial para que pensemos em Artigo Científico e Divulgação Científica.



Explico essa questão a partir de uma amiga que temos em comum, Glória e eu, de longa data, trata-se de Maria Eugênia Boaventura, que por sua vez é casada com Gilson. Glória e Maria Eugênia e Gilson, cursavam o mestrado na época. A Glória e a Maria Eugênia alunas orientandas do Prof. José Aderaldo Castello, participavam ativamente das pesquisas desse grande Historiador da Literatura Brasileira, que tinha como parceiro o Prof. Antonio Cândido aqui na universidade. Ficavam intrigadas quando comparavam os seus trabalhos de pós-graduação com os de Gilson. Elas produziam no mínimo 100 a 150 páginas de narrativa, enquanto o Gilson, aqui da química, apresentava um comentário inicial de meia página a uma página e mais meia a uma página com fórmulas. Enfim para elas era uma aberração: como que esse trabalho minúsculo pode representar dias e noites de intenso trabalho de pesquisa. Esse casal tornaram-se professores na Unicamp o Gilson Herbert Magalhães Dias na área de química e a Maria Eugênia em Literatura Brasileira. A Glória anexou à sua formação na área de Literatura Brasileira as ciências da comunicação onde, além de professora, dirige o NJR-ECA/USP, não pode comparecer hoje aqui por aconselhamento médico. Acho que quem sai perdendo são vocês, pois ela é a comunicadora de fato.



O que essa história tem a ver com o Artigo Científico?



Da maneira mais simplificada possível deduzimos que para cada ciência temos uma forma de expressar o conhecimento. Para se falar da literatura exige-se uma narrativa extensa longa onde se usa o próprio texto para exercer o papel de exemplo. Este é o chamado meta-texto, o texto que fala do texto e tenta explicar o texto. Mesmo que tenha uma narrativa alongada, no caso da literatura, não deixa de ser um texto para iniciados tanto quanto aquele texto de química repleto de fórmulas que cabe em uma só página.



Para as ciências naturais e biológicas não é diferente. O cientista apresenta seus resultados com auxílio da própria ciência. Isto é, o suporte da explicação para falar da física é realizado com elementos intrínsecos da própria física. Como é uma ciência exata não é permitido o uso das figuras de linguagem. O buraco-negro, por exemplo, para um físico, é um substantivo impregnado de cálculos e fórmulas que resultam em um evento que prevê uma sequência de acontecimentos para se ter aquela experiência singular. Como se vê não é uma metáfora, mas uma representação teórica que de fato é um buraco concreto e negro em algum lugar do universo.



Na biologia ocorre a mesma coisa. Para relatar a clonagem toda explicação se resume nos procedimentos de intervenção numa dada célula e o resultado de sua replicação. Em nenhum momento usa-se uma linguagem de relações ela é altamente informativa e o tempo todo impregnada de terminologia nominativa. Tanto é que os biólogos até se assustaram com tanta inspiração que isso gerou exatamente pela pouca compreensão do assunto. As correlações tornaram-se uma literatura à parte. Os europeus morreram de medo de clonarem pequenos hitlers, os americanos, numa concepção pragmática, uma auto-clonagem de si mesmos, ou dos grandes gênios d a humanidade, já os brasileiros alguma mulher bonita. Essa era uma interpretação que C. Pavan gostava de fazer. . .



Não entendo absolutamente nada de química, mas tenho certeza que um químico vai compreender o artigo de outro químico pela própria química.



A essa redundância onde essa narrativa de códigos de um tipo de conhecimento são utilizadas para explicá-lo o filosofo Derrida chama de meta-relato, que é exatamente a ciência explicada pela ciência pelos seus instrumentos de pesquisa. Uma narrativa fechada nela mesma. Onde quem não faz parte daquele tipo de conhecimento não consegue entender nada, mas quem faz aquela determinada ciência acha que todo mundo deve compreender naturalmente. Ou, com ma fé, acha que é assim mesmo afinal não tem o menor interesse que a plebe venha tomar conhecimento do que se trata.



Para que serve o Artigo Científico?



Esta questão parece que é aquela que todos conhecem. Todo pesquisador tem como objetivo fazer uma imensidão de artigos. Significa melhora no currículo Lattes. Ou sonhando alto, quem não quer ter Artigo Científico publicado nas principais revistas? Na Science, na Nature. Nada é impossível. Para um pesquisador acho que deve ser um projeto de vida conseguir esse espaço. Mas, será que é só isso? A pesquisa científica quase que integralmente paga com dinheiro público, sobretudo aqui no Brasil, merece ser apresentada à sociedade que investe nela. Nesse momento entra a Divulgação Científica. Também é nesse momento que o Artigo Científico torna-se fonte primária para abastecer a Divulgação Científica. O jornalismo científico que consiste no noticiário cotidiano baseado nos fatos novos se abastece dessa rica fonte. Ela é primária porque representa a informação de fato como ela é. Afinal nenhum cientista realiza uma experiência no laboratório e relata no seu Artigo Científico outra coisa. O Artigo Científico nessa situação representa a fala do cientista ipsis literis.



Quais caminhos levam pesquisador a um projeto comunicação?



Em primeiro lugar fazer ciência e novamente em primeiro lugar usar a comunicação. Nesse caso não tem o segundo lugar, isto é, fazer ciência e se comunicar o mais amplamente possível são uma coisa só. Nós vivemos numa sociedade da comunicação. Viver fechado dentro de um laboratório não vai tornar a ciência mais avançada. Com certeza não vai levar o cientista ou o seu grupo a querer de fato buscar patentes, emplacar artigos em espaços de visibilidade assim por diante e acima de tudo não vai gerar discussões críticas. É um jogo do saber. Nesse caso só se fará ciência burocrática, publicações burocráticas. Um fechamento total. Aqui recorremos a um exemplo tão antigo quanto atual foi a sua iniciativa. José Reis, nosso honorável patrono, entrou para o Instituto Biológico de São Paulo, para ser pesquisador logo após a criação da entidade. Foi escalado para estudar as aves e foi o que fez com grande competência. Mas achou pouco ficar lá nos laboratórios do Instituto preso a uma placa-de-petri, como costumava repetir. Resolveu isso lá no início dos anos de 1930, ir diretamente aos produtores de aves. Escreveu cartilhas para os criadores, montou alguns documentários, pegou alguns microscópios e os adaptou em um furgão, daqueles com cara de calhambeque, um mini-centro de divulgação científica móvel. Tomou rumo às Chácaras e Sítios,da atual Grande São Paulo, dando aulas, conferências e fazendo experiências in loco para os esperançosos e aturdidos criadores de aves de então. Suas pesquisas chegaram em primeira mão aos destinatários de fato. Se auto proclamou de Caixeiro Viajante da Ciência. Enquanto realizava essas atividades não deixou de publicar nos Anais do Instituto Biológico de São Paulo os resultados de suas pesquisas em forma de Artigo Científico. Tinha leitores assíduos na Europa, sobretudo na Alemanha, e nos Estados Unidos. Tinha a paciência de verter seus artigos para várias línguas.



Como os grandes cientistas se tornaram grandes?



Newton costumava escrever cartas, aliás, essa atitude é que, diz a lenda, efetivamente determinou o modelo dos primeiros artigos científicos de largo conhecimento, pois foi com uma correspondência tumultuada e provocativa com Leibniz e Hooke, que hoje podemos estudar como a comunicação foi essencial para esse cientista aparentemente fechado em si mesmo. Fazia questão de escrever só em latim para que ninguém surrupiasse suas idéias, nessa atitude diferenciada sabe-se que era uma forma de se comunicar mais intensamente. É a comunicação pelo inusitado, pelo não igual, pelo diferente. Tal qual pensam os teóricos da Escola de São Paulo de estudos comunicacionais, da qual a Glória Kreinz faz parte e tem como liderança Ciro Marcondes Filho aqui na ECA/USP. Voltando ao Isaac Newton, por sinal este cientista tem uma representatividade extraordinária, para vocês, foi um intenso praticante da Alquimia concomitante com a direção da Royal Science Academy e as aulas em Cambridge e de quebra interpretava as previsões bíblicas do profeta Daniel, interessantíssimo. Halley um de seus poucos alunos que o diga. Afinal para Newton a teoria da gravitação tinha um sabor mais matemático do que a explicação da grande lei da física.


O que fazer para produzir artigos científicos?



Infelizmente nos cursos de graduação não há uma disciplina apropriada para divulgação científica. Até poderia ser uma disciplina gostosa de se fazer. Como princípio deveria ser: como posso de fato me comunicar? Parodiando o título do livro de Ciro Marcondes Filho da ECA que pergunta: Será que de fato nos comunicamos? Essa é a grande questão. Produzir um Artigo Científico para um pesquisador não exige grande esforço. É um relato como afirmamos da ciência pela ciência. A ciência sendo explicada pela ciência. Técnicas, procedimentos, mensurações, tempo, mensuração e resultados. Quem quiser replicar para validar ou invalidar, vai ter que usar a própria ciência. Hoje com a Internet ficou mais fácil ainda. Pulemos aquela fase onde fala do andamento da pesquisa, do teor do artigo ser ou não inédito, etc. enfim o artigo em si. Ele também não tem segredos. Todas as publicações possuem as regras, a estrutura do artigo que, hoje, são invariáveis, tem um padrão que deve ser seguido, uma forma amplamente admitida pelos editores das revistas especializadas, tratam-se das normas que cada publicação pede que seja respeitada para aceitar o artigo. Datas de envio, período de submissão, peer view press, aceite do comitê e do editor, enfim o rito sumário para a publicação que se repete e de tempos em tempos algum bibliotecário inclui uma norma a mais. É exaustivo, mas ... necessário. Enfim todos caem no publique ou morra (publish or perish), que não é de maneira alguma comunicação é pura burocracia. O Núcleo sempre se preocupou com essa questão o melhor é que haja divulgadores científicos trabalhando junto com os pesquisadores para poder efetivar uma divulgação plena. Ou pelo menos há a necessidade de treinarmos os cientistas para comunicar o desenvolvimento de suas pesquisas na forma mais plena possível.


Comunicar-se é outra coisa. É um namoro das idéias com a narrativa. Tem que ter paixão. A paixão por aquilo que fazemos, no caso a ciência, e a troca anunciando esse amor a todo mundo. Essa é a narrativa na forma de divulgação científica, nos termos da Profa. Glória Kreinz e do Prof. Crodowaldo Pavan.

sexta-feira, 1 de maio de 2009

“Escola de São Paulo” de estudos de comunicação

Sobre a Escola de São Paulo de estudos de comunicação



Glória Kreinz NJR
Sediada na Escola de Comunicações e Artes da USP, a Escola de São Paulo de estudos de comunicação esteve vinculada ao NTC – Cento de Estudos e Pesquisas em Comunicação, Cultura e Tecnologia e ao FiloCom – Núcleo de Estudos Filosóficos da Comunicação. Seus membros reuniram-se primeiramente em 1989, logo após o encerramento do ciclo “Psicanálise da Comunicação”, em quatro módulos, que rendeu a obra A construção social da loucura (Paulus, 2003), durou até 1992. Foi o momento em que o discurso pós-moderno avançava na Academia, e a comunicação, em vista das mudanças tecnológicas e diante da falência das ideologias e da “crise de paradigmas” que havia se instalado nas ciências humanas, exigia uma nova teoria. Ainda não existia um núcleo de pesquisa, apenas pesquisadores associados ao Projeto. Começaram a ser ministrados os primeiros dos 23 cursos de pós-graduação com o título “Nova Teoria da Comunicação”. Os colaboradores desta época foram Wilson Roberto Ferreira Vieira, Jair Marcatti Jr., Liv Sovik, Fernando Barone, Maria Christina Daniels e Arim Soares do Bem. As principais obras do período foram A sociedade Frankenstein (1991), Televisão (Scipione, 1994), Quem manipula quem (Vozes, 1986).
Ciro Marcondes FilhoO teórico idealizador da Escola de São Paulo
Dois fatos marcaram essa época e o início do Projeto “Nova Teoria da Comunicação”. O primeiro, a constatação surgida em pequenos grupos de debates da época, de que o novo surge da troca informal entre membros de um grupo teórico de discussão. São os insights que posteriormente irão revolucionar a teoria e instaurar o novo, realizar a comunicação. Neste encontro livre, espontâneo e criativo de cabeças pensantes nasce efetivamente a ciência. O segundo, exemplificado na tese de Arim Soares do Bem sobre a televisão e a empregada doméstica (ECA-USP), seguindo uma idéia antes esboçada por Dieter Prokop, demonstrou-se que seria possível estudar o fenômeno da comunicação no exato momento em que ela ocorria (a razão que comanda o estudo da comunicação opera no “durante”).A segunda fase, de 1992 a 1998, foi o período da criação do NTC – Centro de Estudos e Pesquisas em Novas Tecnologias, Comunicação e Cultura, de sua editora, da rede nacional de colaboradores, e de sua revista Atrator estranho, que inovou a discussão das tecnologias comunicacionais pelo país afora. Foi um período preparatório à Nova Teoria, em que os 37 volumes publicados da revista, resultados de 45 encontros de debates, assim como a obra coletiva Pensar-Pulsar (NTC, 1996), e os demais volumes Cenários do Novo Mundo (NTC, 1998), Vivências eletrônicas (NTC, 1998) e Super-Ciber, a sociedade místico-tecnológica do século XXI (Ática, 1997), ampliaram o debate e introduziram novos temas e achados diversos, resultantes de intensivo trabalho de debates, publicações e trocas nacionais e internacionais de proposições teóricas e intelectuais. Participaram desta fase da Nova Teoria, como membros e colaboradores do NTC, Rose Rocha, Beltrina Corte, Solange Wajnman, Eugênio Rondini Trivinho, Mayra Rodrigues Gomes, Vani Kenski, Denise Conceição, Rodrigo Assunção e Marta Catunda.
Entre 1998 e o ano 2000, a Escola de São Paulo de estudos de comunicação continuou a operar, contando com o ingresso das pesquisadoras Danielle Naves de Oliveira, Tarcyanie Cajueiro Santos e Ana Célia Mantinez Guarnieri. Em Grenoble, o coordenador avançou os estudos e as investigações, produzindo a obra Viagem na irrealidade da comunicação (Grenoble, 2000), que deu origem ao primeiro volume, ainda provisório, da Trilogia “Nova Teoria da Comunicação”, que sairia na primeira década no novo século.
A terceira fase começa em 2000, com a criação do FiloCom e a orientação do Núcleo para a apresentação efetiva da Nova Teoria. Desta nova fase fizeram parte as obras O espelho e a máscara. O enigma da comunicação e o caminho do meio (Discurso, 2002), Da arte de envenenar dinossauros e outros ensaios mediáticos (2003), O escavador de silêncios, formas de construir e desconstruir a comunicação (Paulus, 2004), Até que ponto, de fato, nos comunicamos (Paulus, 2004) e, mais recentemente, Para entender a comunicação. Contatos antecipados com a Nova Teoria (Paulus, 2008). Participaram ativamente neste período os seguintes colaboradores Elenildes Dantas, Marco Toledo de Assis Bastos, Eliany Machado Salvatierra, Maria Helena Charro, Cristina Pontes Bonfiglioli, Ana Elisa Antunes Viviani, Paulo Masella, Rafael Elias Teixeira, Paulo da Silva Quadros, Pe. Valdir Castro. Naiara Raggiotti fez o trabalho de revisão da obra Da arte de envenenar dinossauros e a obra foi, por isso, a ela dedicada. Mauro Celso Destácio, do Núcleo José Reis, foi assíduo participante dos cursos e das discussões. Neste período mais recente, a Escola de São Paulo conta com novos colaboradores, recém-ingressos na equipe: Ana Paula de Morais Teixeira, Karenine M. R. Cunha, Cristina Valéria Flausino, Eliana Costa Simões e Claudenir Módulo.
Membros efetivos e permanentes de todas as fases da equipe foram José Alberto Sheik Pereira e eu, Glória Kreinz.

segunda-feira, 6 de abril de 2009

O Estado de S. Paulo
sexta-feira, 3 de abril de 2009, 15:54


Morre Crodowaldo Pavan, pioneiro da genética no Brasil
Pavan tinha 89 anos; foi professor da USP e da Unicamp,
e pesquisou os efeitos da radiação nos genes
Herton Escobar e Alexandre Gonçalves, de O Estado de S. Paulo

SÃO PAULO - Morreu nesta sexta-feira, 2, aos 89 anos, o geneticista Crodowaldo Pavan, uma das figuras mais importantes da ciência brasileira. Nascido em Campinas e formado pela Universidade de São Paulo (USP), ele foi um dos fundadores da genética no País, formou dezenas de pesquisadores no Brasil e nos Estados Unidos, publicou trabalhos de repercussão internacional e liderou algumas das instituições científicas mais importantes do País.

“Ele era um grande líder, daqueles que não se encontra mais hoje em dia”, disse a geneticista Mayana Zatz, diretora do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP, que foi aluna de Pavan na graduação. “A história do Pavan se confunde com a história da genética no Brasil; é impossível separar uma coisa da outra”, disse outro notório ex-aluno, o geneticista Francisco Salzano, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.

O professor imortal, que nunca fugia de uma discussão - ao contrário, fazia questão de iniciar muitas delas -, morreu no início da tarde de ontem, no Hospital Universitário da USP. Ele estava internado desde o dia 26, quando se sentiu mal. Na madrugada do dia 27, sofreu um enfarte e seu quadro clínico deteriorou-se, até uma falência de órgãos. Ele tinha câncer, mas não ficou claro se isso teve influência na morte.

Pavan foi presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) entre 1981 e 1986, quando, entre outras coisas, liderou uma campanha para incluir a autonomia universitária e o apoio à ciência e à tecnologia no texto da Constituição de 1988. Também foi uma voz importante na criação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), em 1985. “Ele foi uma liderança crucial em momentos importantíssimos da ciência no Brasil”, disse ao Estado o atual presidente da SBPC, Marco Antonio Raupp.

Entre 1981 e 1984, Pavan foi diretor-presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Entre 1986 e 1990, presidiu o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão do MCT que financia a maior parte das pesquisas no País. Entrou dizendo que ia multiplicar o orçamento e o número de bolsas, que passou de 10 mil para quase 50 mil. “O Pavan era um figura notável, que marcava presença em todos os lugares por que passava”, disse o chefe de gabinete do CNPq, Felizardo Penalva, também ex-aluno dele na pós-graduação do Departamento de Genética da USP - que, aliás, foi criado por Pavan.

Para Mara Hutz, presidente da Sociedade Brasileira de Genética (SBG) e professora da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (Ufrgs), Pavan colocou o Brasil no mapa da genética no mundo. “Sempre foi uma pessoa muito participativa que viveu intensamente a política científica brasileira”, aponta Mara.
Na década de 40, Pavan pesquisou ao lado do renomado biólogo Theodore Dobzhansky, na Universidade Columbia. Nas décadas de 60 e 70, foi pesquisador da divisão de biologia do Oak Ridge National Laboratory e virou professor vitalício de genética da Universidade do Texas. “Ele poderia ter ficado nos EUA, mas preferiu voltar para ajudar no desenvolvimento do Brasil”, disse Penalva.

Carlos Menck, vice-presidente da SBG e livre-docente do Instituto de Ciências Biomédicas da USP, assistiu aulas de Pavan durante a graduação na década de 70. “Eram altamente estimulantes. Queria que as pessoas se dedicassem à ciência por gosto.” No ano passado, Menck, Pavan e outros professores participaram de uma conversa com alunos sobre as perspectivas da biologia. “Pavan falou durante uma hora e meia”, conta Menck. “E dizia com alegria: ‘Tive o privilégio de receber um salário para me divertir’.”

CROMOSSOMOS

A principal contribuição científica de Pavan foi baseada no estudo das larvas de uma mosca chamada Rhynchosciara angelae. Suas pesquisas revelaram um processo chamado amplificação gênica de cromossomos politênicos (gigantes), pelo qual partes dos cromossosmos “inflam” por causa da duplicação de trechos de DNA. Sua especialidade era genética de populações e celular.

Tão marcante quanto a produção científica era a personalidade forte de Pavan. Para o colega e ex-aluno Salzano, ela poderia ser resumida em três palavras: simplicidade, espontaneidade e veemência. As duas últimas referem-se à maneira como Pavan sempre se fazia ouvir em todos os eventos de que participava. “Jamais estive em uma conferência com o Pavan que ele não pedisse a palavra ao microfone”, disse o médico Eduardo Krieger, ex-presidente da Academia Brasileira de Ciências.

O geneticista Sergio Pena, da Universidade Federal de Minas Gerais, lembra-se bem das intervenções de Pavan, que criticava abertamente os projetos de sequenciamento genômico no Brasil. “Esse era o Pavan, nunca de meias palavras. Mesmo quando estava errado, ele era uma presença sempre estimulante.”

Herton Escobar escreveu no Estadão:


O Estado de S.Paulo
Sábado, 04 de Abril de 2009


Morre Crodowaldo Pavan, um pioneiro da genética no Brasil
Biólogo liderou importantes instituições científicas e formou gerações de pesquisadores

Herton Escobar

Morreu ontem, aos 89 anos, o geneticista Crodowaldo Pavan, uma das figuras mais importantes da ciência brasileira. Nascido em Campinas e formado pela Universidade de São Paulo (USP), ele foi um dos fundadores da genética no País, formou dezenas de pesquisadores no Brasil e nos Estados Unidos, publicou trabalhos de repercussão internacional e liderou algumas das instituições científicas mais importantes do País."Ele era um grande líder, daqueles que não se encontra mais hoje em dia", disse a geneticista Mayana Zatz, diretora do Centro de Estudos do Genoma Humano da USP, que foi aluna de Pavan na graduação. "A história do Pavan se confunde com a história da genética no Brasil; é impossível separar uma coisa da outra", disse outro notório ex-aluno, o geneticista Francisco Salzano, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul.O professor imortal, que nunca fugia de uma discussão - ao contrário, fazia questão de iniciar muitas delas -, morreu no início da tarde de ontem, no Hospital Universitário da USP. Ele estava internado desde o dia 26, quando se sentiu mal. Na madrugada do dia 27, sofreu um enfarte e seu quadro clínico deteriorou-se, até uma falência de órgãos. Ele tinha câncer, mas não ficou claro se isso teve influência na morte.Pavan foi presidente da Sociedade Brasileira para o Progresso da Ciência (SBPC) entre 1981 e 1986, quando, entre outras coisas, liderou uma campanha para incluir a autonomia universitária e o apoio à ciência e à tecnologia no texto da Constituição de 1988. Também foi uma voz importante na criação do Ministério da Ciência e Tecnologia (MCT), em 1985. "Ele foi uma liderança crucial em momentos importantíssimos da ciência no Brasil", disse ao Estado o atual presidente da SBPC, Marco Antonio Raupp.Entre 1981 e 1984, Pavan foi diretor-presidente da Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo (Fapesp). Entre 1986 e 1990, presidiu o Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico (CNPq), órgão do MCT que financia a maior parte das pesquisas no País. Entrou dizendo que ia multiplicar o orçamento e o número de bolsas, que passou de 10 mil para quase 50 mil. "O Pavan era um figura notável, que marcava presença em todos os lugares por que passava", disse o chefe de gabinete do CNPq, Felizardo Penalva, também ex-aluno dele na pós-graduação do Departamento de Genética da USP - que, aliás, foi criado por Pavan.Na década de 40, Pavan pesquisou ao lado do renomado biólogo Theodore Dobzhansky, na Universidade Columbia. Nas décadas de 60 e 70, foi pesquisador da divisão de biologia do Oak Ridge National Laboratory e virou professor vitalício de genética da Universidade do Texas. "Ele poderia ter ficado nos EUA, mas preferiu voltar para ajudar no desenvolvimento do Brasil", disse Penalva.CROMOSSOMOSA principal contribuição científica de Pavan foi baseada no estudo das larvas de uma mosca chamada Rhynchosciara angelae. Suas pesquisas revelaram um processo chamado amplificação gênica de cromossomos politênicos (gigantes), pelo qual partes dos cromossosmos "inflam" por causa da duplicação de trechos de DNA. Sua especialidade era genética de populações e celular.Tão marcante quanto a produção científica era a personalidade forte de Pavan. Para o colega e ex-aluno Salzano, ela poderia ser resumida em três palavras: simplicidade, espontaneidade e veemência. As duas últimas referem-se à maneira como Pavan sempre se fazia ouvir em todos os eventos de que participava. "Jamais estive em uma conferência com o Pavan que ele não pedisse a palavra ao microfone", disse o médico Eduardo Krieger, ex-presidente da Academia Brasileira de Ciências.O geneticista Sergio Pena, da Universidade Federal de Minas Gerais, lembra-se bem das intervenções de Pavan, que criticava abertamente os projetos de sequenciamento genômico no Brasil. "Esse era o Pavan, nunca de meias palavras. Mesmo quando estava errado, ele era uma presença sempre estimulante."

sexta-feira, 3 de abril de 2009